Hoje, Clarice Lispector faria 91 anos, se estivesse viva. Morta em 9 de dezembro de 1977, Clarice nos deixou vinte e quatro obras, entre romances, contos, crônicas e textos infantis. Além de grande escritora, principalmente contista, ela também foi jornalista e tradutora.
E é pelos contos que inicio a minha homenagem a Clarice Lispector, nascida ucraniana, numa aldeia que nem existe no mapa, mas brasileiríssima na alma.
“A quinta história” não foi o primeiro texto que li. Na verdade, descobri a obra de Clarice por meio do conto “Amor”, comentado por um professor, nos tempos da graduação. Além disso, escolhi aquele e não este, pois “A quinta história” tem muito a ver com uma das minhas paixões: ouvir histórias.
Para quem acompanha o blog, sabe que uma das lembranças mais fortes da minha da infância é a história de Ali Baba e os quarentas ladrões. A força da palavra que não abre apenas cavernas, mas constrói sonhos e Literatura. E tal como Sherazade, a voz de “A quinta história também conta histórias. E começa assim:
Esta história poderia chamar-se “As Estátuas”. Outro nome possível é “O Assassinato”. E também “Como Matar Baratas”. Farei então pelo menos três histórias, verdadeiras porque nenhuma delas mente a outra. Embora uma única, seriam mil e uma, se mil e uma noites me dessem. (p. 162)
Narrado em primeira pessoa, por uma dona de casa, ela se queixa de ter baratas em sua casa. Para solucionar o problema, a narradora relata como resolveu a questão: mistura-se “em partes iguais açúcar, farinha e gesso. A farinha e o açúcar as atrairiam, o gesso esturricaria o de-dentro delas. Assim fiz. Morreram.” (p. 162)
E assim se segue: a cada nova história, uma nova narrativa. Sintético. Sedutor. As baratas não são as únicas a se transformarem em estátuas. Nós, leitores, também nos tornamos estátuas. É impossível resistir à mistura precisa de revelação e de mistério, que cada texto clariciano traz. A cada nova história, descobrimos um novo mundo, feito de magia e palavra.
No conto “A quinta história”, a sedução se realiza por meio de um jogo narrativo: são contadas quatro histórias, uma seguida da outra. Chega-se então a última história. A última? Ou seria a quinta de muitas outras? Não há resposta para isso. A nós, leitores petrificados, a solução é imaginar como será a próxima história. E ela “Começa assim: queixe-me de baratas.” Boa leitura!
Onde ler “A quinta história”
A legião estrangeira. 8 ed. São Paulo: Ática, 1989.
Felicidade Clandestina. 7 ed. Rio de Janeiro: Francisco Alves, 1991.