A noite do barulho
Era 1h50 da manhã de sexta-feira quando fui dormir. Um pouco tarde, eu
sei, mas o sono tem se atrasado ultimamente. Preparei tudo: escovei os dentes,
vesti o pijama, arrumei a cama e lá fui para os braços de Morfeu!
Mas nem tudo foram flores e bons sonhos. Enquanto esperava o deus do
sonho chegar, escuto um barulho... não era dentro do quarto... Era no outro
lado da porta, onde deveria reinar apenas o silêncio, quebrado eventualmente
pelo apito pertinente do guarda noturno, que naquela hora devia estar dormindo
e não ouvindo barulhos.
Tento então identificar o que era aquele misterioso ruído.
Pelo avançado da hora, só poderia ser o meu vizinho. Ele costuma fazer
barulho em horários bem estranhos. Além de fazer barulhos bem estranhos também.
Concentro-me e depois de alguns minutos (ou segundos?) chego à única conclusão
possível: aquele som não vinha do vizinho. É bom dizer que não tenho apenas um,
mas vários. Ou seja, poderia ser qualquer vizinho de qualquer andar. Seria
alguém do primeiro?
A ideia foi logo descartada. O barulho era irritante, mas não alto o
suficiente a ponto de sair do primeiro andar e subir as escadas só para me
incomodar. Além do mais, o barulho lembrava alguma coisa, porém não conseguia
saber o que era com certeza. Poderia ser qualquer coisa ou pessoa...
possibilidade também descartada. Teria que ser no mínimo o Homem Aranha para
escalar vários andares até chegar a minha casa. Ops. Apartamento.
O barulho continuava. Estava mais alto e persistente. E uma coisa era
certa: aquele som estava atrasando o meu sono, ou melhor, atrapalhando o meu
sono. O jeito era sair, procurar o ruído e acabar com aquela barulheira. Saio
da cama decidida. Agora vamos ver quem vai fazer barulho aqui! Lembro-me então
que precisaria abrir a porta do quarto para descobrir onde estava aquele som.
Obviamente o medo já tinha aparecido para animar a pessoa. Mas lá fui eu, com
medo mesmo e sem animação alguma.
Uma vez no lado de fora, a sala era parcialmente iluminada pela luz do
quarto. Olho em volta e não vejo nada. Já o ruído... sumiu? Era chuva? Pergunto
sem convicção alguma. Vou até a janela da sacada e só vejo o escuro e as luzes
das casas. Já a chuva... esta, pelo visto, nunca existiu. Decidida a ir dormir,
com ou sem barulho, dou meia volta rumo à cama e quem sabe ao sono, quando descubro
que tinha chuva mesmo. E estava atrás da porta. Atrás da porta do banheiro! E
agora, José?
Temendo o pior. Tremendo pelo pior. Encostei o ouvido na porta,
imaginando que pudesse se alguém! Só escuto água caindo. Quem estaria tomando
banho à uma hora desta? Seria mesmo o Homem-Aranha, que resolverá usar o meu
banheiro para se limpar? (Herói também se suja!)
Abro a porta vagarosamente. Não estava com pressa! Toco no interruptor
como quem coloca a mão num buraco desconhecido: morrendo de medo e com os olhos
fechados. Click! A luz ilumina tudo. Inclusive o box... vazio? Por um motivo
que desconheço, meu chuveiro resolveu fingir que o banho não tinha acabado e
ficará ligado. Ou quase ligado. Fecho o registro. Amaldiçoo o chuveiro e toda
sua família. Isto é hora de abrir? Por que abriu? Por favor, né? Vamos
colaborar com a humanidade!
Voltei para cama irritada. Até Morfeu já tinha ido dormir. Deito e me
enrolo no edredom. Antes disso, dou uma olhada no relógio do celular: são duas
da manhã. Esta noite rendeu mesmo. De repente... o chuveiro de novo não! Já
virou sacanagem. Mas para alivio geral da nação não era o chuveiro de novo não.
Era a chuva sim! Puxo o edredom mais um pouco para me enrolar mais uma vez. O
som da chuva era tranquilizante. Fecho os olhos... sinto o sonho chegar... Só
espero que não seja com o chuveiro!